23 fevereiro 2006

VITAMEDIAS

O estado dos jornalistas

1) O caso 24 Horas
A intrusão numa redacção de jornalistas e remoção de um, dois ou vários computadores é um atentado à protecção das fontes mas não (por enquanto mas caminhamos rapidamente para lá) à liberdade de expressão.
É uma ameaça que se vai repetir? Está por provar. Mas se já sucedeu no Tal & Qual por causa de droga importada da Holanda e, não me lembro porquê, no Correio da Manhã, porquê a dúvida?
Mas esta redacção (e as outras, claro) tão ciente dos seus direitos (e ainda bem) questiona quem dentro da empresa tem acesso aos sites a que acede, aos telefones para quem telefona, aos telexes a quem telexa? E sabem que existe uma factura detalhada dos telefones de onde ligam?
Claro que sabem, foi aquilo a que tiveram acesso - com ligações que serviram para diferentes primeiras páginas.
Ninguém se questiona quando o computador tem um problema técnico e qual o(s) informático(s) que a ele acede, mesmo se é de uma empresa externa? É que deviam preocupar-se.
Porque não há-de esse informático revelar ao patrão certas notícias - se este o exigir, claro, pressionado pelo interesse do que é "notícia" e, se estiver na Bolsa, ainda mais.
Para os bloguistas que querem ser jornalistas, convinha pensarem um pouco sobre o que é realmente o (falso) corporativismo ou, simplesmente, a ineficaz defesa dos seus putativos direitos enquanto free-lancers até que alguém os tenha de defender em casos complicados. E não, não é por delito de opinião - é quando se começar a investigar o que dizem sem terem provas para consubstanciar o que dizem.
Isto se realmente acharem que estão a fazer jornalismo, o que alguns "posts" abaixo parecem não ser o que acontece actualmente noutros países. E sabem como nós gostamos de imitar o que se passa lá fora. É tão, sei lá, tão... moderno?

2) o caso Lusa...
...que o Conselho Deontológico (CD) do Sindicato dos Jornalistas (SJ) teima em chamar de caso "banda larga".
O CD é levado a pronunciar-se sobre duas questões levantadas em concreto pela direcção da Lusa mas responde a quatro, incluindo um maior texto no seu "parecer" sobre as jornalistas, as quais não lhe tinham pedido opinião (deontológica ou outra mas apanham por tabela) e nem sequer foram ouvidas. Bastaram as notícias.
Se o CD quer re-analisar o seu comunicado à luz de novas indicações, como disse, comece por essa (e sim, li o comunicado naquele formato Word, não passei na diagonal por ele).
Além disto, o penoso em termos de tecnologia é que:
- o CD dá razão a questões técnicas provindas de uma entidade ligada ao MCTES e não procura o contraditório (bastava ler o documento governamental sobre a Iniciativa Nacional para a Banda Larga que este governo não desdenhou).
- o CD dá razão à Lusa quando esta altera ADSL para banda larga (ou vice-versa) quando é a mesma coisa em termos de generalização jornalística e nem sequer devia merecer uma menção num comunicado desta "importância".
- o CD aceita que uma tecnologia como a agregação de dois para quatro canais de RDIS passe a ser "banda larga", o que é discutível tecnicamente e daria razão às jornalistas da Lusa mesmo depois de "desmentidas" pela Direcção de Informação e confirmando assim o que tinham dito na notícia original: há escolas em Portugal que não têm banda larga e o governo mentiu quando disse que estavam todas ligadas.
Não defendo que as jornalistas tenham agido bem. Deviam ter procurado contraditar os factos.
Mas - principalmente numa agência de notícias, presumo - o contraditório foi feito e seria prosseguido: o governo diz ter todas as escolas ligadas em banda larga mas afinal há algumas que o não estão. Isto é notícia e é o contraditório sobre o que já antes tinha sido dito pelo Governo.
Quanto ao inacreditável comunicado do Sindicato dos Jornalistas sobre o parecer do CD - não e não acredito que isso se justifique apenas pela desistência dos sindicalizados -, mas é incrível que numa situação destas o SJ se tenha pronunciado contra o CD. Não é por corporativismo, é simplesmente pela necessária independência defendida de orgãos que aparentemente deviam ser... independentes.
O CD que errou no parecer - é a minha opinião - sai-se bem no comunicado posterior.
Nota: Já agora, porque é foi no Público que apareceram mais notícias sobre este assunto? Nem a Lusa lhe deu tanta importância...

3) Clube dos Jornalistas (2:, 22.Fev.2006, 23h45m embora sempre anunciado às 23h30m)
Primeiro, no online, o Clube que tanto procura a verdade para a transmitir semanalmente aos espectadores mantém há dias uma pequena nota sobre a ligação do novo projecto jornalístico do ex-director do Expresso ao BCP, sugerindo ligações à Opus Dei. É uma vergonha e já o disse antes. Se algumas fontes "sugerissem" que esta "notícia" aparece por o Clube ser patrocinado pela CGD, o que diriam os seus responsáveis?
No ecrã, elogia-se o "excelente serviço para o jornalismo" prestado pelo 24 Horas sem se saber os pormenores concretos da investigação.
Alfredo Maia, presidente do SJ, revela que o sindicato anda a discutir a protecção dos jornalistas nas redacções ou no domicílio. Só?
Ficámos a saber que o 24 Horas, solicitou "opinião" estrangeira sobre o que lhe tinha acontecido mas a nota na 1ª página de hoje foi "a reacção" dos mesmos, como se eles se tivessem pronunciado per si.
Jornalismo de referência, sem dúvida. Para quem tem dúvidas, é quem noticia hoje na primeira página sobre filhos criminosos e conforto electrónico procurado junto dos "papás".

4) Aquilo que poucos acham que tem a ver com os jornalistas
A aprovação esta semana da lei comunitária sobre o registo das comunicações electrónicas foi pouco discutida por cá, votada sem esclarecimentos públicos e, como é normal em Portugal, será questionada daqui a uns meses sob a cortina da ignorância.
Tirando o blogue Blasfémias (não vi outros com tanta veemência, lamento) ninguém se posicionou a sério para debater a questão e procurar razões nacionais para a aprovação comunitária (dois países votaram contra, ninguém quer saber porquê?).
As autoridades nacionais nem sequer precisaram de bater palmas e com razão.
Os jornalistas podem daqui a 18 meses após a impressão no Diário das Comunidades, se houver fuga do segredo de justiça, ter acesso às ligações - não é ainda aos conteúdos mas lá havemos de chegar. Tal como o 24 Horas teve no caso acima referido, e saber quem ligou para quem e a que horas.
Depois, os "jornalistas" como os que estavam na revista Sábado e fizeram capa de que tinham falado com os envolvidos no envelope 9, podem começar a telefonar para todos os listados no envelope 19, 29, 39 ou 9999 em toda a UE. Eles não têm nada para dizer mas que interessa, é capa!

5) A Ordem
O Sindicato não tem andado bem, o CD também não.
Mas é sempre nestas alturas que surgem almas a peregrinar para a constituição de uma Ordem dos Jornalistas.
Não sou nem contra nem a favor. Tenho dúvidas para ambas as soluções.
Mas para quem a defende e argumenta com exemplos doutras ordens, podem revelar casos em que os seus CDs tenham agido sem ser de forma corporativa e penalizado os seus "ordenados" faltosos? Quer dizer, para 5000 associados, são 2 penalizados?
É que sem Ordem já temos o Código Penal, o Estatuto do Jornalista, a fiscalização da próxima ERC, etc... sem falar do inevitável Código Deontológico. Não chega?
Não querem vigiar outros? Pô-los na ordem, sei lá...